Sunday, March 26, 2006

Maio de 1968: "O Futuro só conterá o que pusermos nele hoje!"

Será razoável comparar o Maio de 68 a Março de 2006? A Universidade de Sorbonne, símbolo da Revolução de Maio de 1968, é, actualmente, o local de partida para a luta dos estudantes franceses. Foi um acaso? Será que estou a ser ousada em fazer uma comparação, e referir que se trata de uma revolução?

A definição da palavra Revolução, que consta na Enciclopédia Larousse, define-a como: "Mudança brusca e violenta na estrutura política e social de um Estado, que se produz quando um grupo se revolta contra as autoridades estabelecidas e toma o poder." Não obstante, são múltiplas as definições para a mesma palavra, as ciências sociais também não estão em uníssono. (Ver:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o)
Apesar da multiplicidade de definições é certo que a história descreve vários tipos de revoluções: Industrial, Social, Política, etc ... e todas resultaram em MUDANÇAS.

A Universidade de Sorbonne foi o palco escolhido pelos estudantes franceses para se manifestarem contra o CPE (Contrato de Primeiro Emprego). Contudo, Paris nos últimos tempos tem sido alvo de constantes manifestações. Algo se passa! Mas será que o que está a acontecer em Paris é um sentimento isolado, sem repercussões?

Falemos do caso português, como estão os empregos em Portugal, como são feitos os contratos em Portugal, que providência está o tomar o Estado português para evitar uma revolução?
Parece-me que não precisa de o fazer porque os estudantes portugueses não os ameaçam!
Há 30 anos atrás não poderia escrever este texto, mas depois da Revolução de 25 de Abril de 1974, alguns direitos começaram a ser desfrutados, e é neste espírito que peço a todos os futuros desempregados de antropologia ou de outras ciências, para reflectirmos o que queremos para o Futuro, para juntos lutarmos pelo futuro.
Colocarmos no futuro aquilo que pensamos ser solução. Temos a oportunidade e os motivos, temos que seguir as palavras de Etienne de la Boétie no Discours de la servitude volontaire: “São, pois, os povos que se deixam oprimir, que tudo fazem para serem esmagados, pois deixariam de o ser no dia em que deixassem de servir"... "É espantoso como eles se deixam levar pelas cócegas...os teatros, os jogos, as farsas..."
Pois é “a Luta Continua” e como já referi todas as revoluções resultam em mudanças, coloquemos nos nossos objectivos mudar o destino do nosso futuro: "Sejamos razoáveis peçamos o impossível."

Wednesday, March 15, 2006

O sino que geme!

"Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê."
Luís de Camões

Toquem os sinos, A ANTROPOLOGIA, tem muito trabalho pela frente!!!
Outro dia discutia com uma colega, a importância das tradições, (inventadas ou não) se elas seriam sinónimo de atraso, ou de primitivismo.
Pois chamem-me romântica, mas eu quero um país assimétrico, em que a assimetria convirja num conhecimento prospectivo e entendimento mútuo.
O assunto que trago para este “muro” prende-se com a morte, não como é percepcionada, mas sim como a morte é vivida. Que bizarro, a morte é vivida!
Recentemente fui a um funeral, de uma grande senhora – a minha querida avó – dela herdei a minha parte minhota (esta herança ultrapassa a questão dos pelos) e com ela aprendi até à sua morte. Talvez esta seja uma pequena homenagem à única avó que tive!
Pela primeira vez, ESCUTEI e OUVI os sinos, o meu pai ensinou-me que os sinos quando anunciam a morte, gemem! Eu juro que consegui ouvir o gemido!

Vou retornar ao assunto: as assimetrias da vivência da morte. A versão que consultei da monografia de José Cutileiro data de 1976, Ricos e Pobres no Alentejo. José Cutileiro abordou o tema da vivência da morte - o funeral -como uma cerimónia religiosa. Na freguesia onde o autor realizou a sua observação, pode constatar que o padre orava junto ao corpo na tarde anterior ao funeral, o padre também proferia as ultimas orações pelo defunto junto da sepultura. Contudo o autor não se prolonga sobre a religiosidade da freguesia alentejana, refere: “Para eles, a religião consiste no baptismo, no casamento e no enterro.” A intervenção do padre constitui parte das tradicionais manifestações de pesar pelo defunto: a sua presença confere ao funeral a solenidade de que outro modo lhe faltaria.” Em dois parágrafos o autor sintetiza a prática do funeral naquela freguesia alentejana.
Em 1989, João Pina de Cabral, editou a monografia Filhos de Adão, Filhos de Eva, dedicou um capítulo ao tema Morte e Enterro. A monografia decorre em duas freguesias do Alto Minho. João Pina Cabral descreve os momentos que, após a morte, são utilizados para a preparação do corpo e do espaço onde o defunto irá ficar. Algumas das práticas descritas pelo autor ainda são paraticadas: “Os parentes entregam-se ao choro…e tem o efeito de chamar a atenção de todos os vizinhos próximos, que logo acodem”; “uma lamparina de azeite fica acesa ao lado do morto, para o resguardar das influências maléficas”; “para acolher a súbita afluência de gente que irá encher a casa …nos três dias seguintes, a cozinha será utilizada ininterruptamente, produzindo refeições de melhor qualidade para as pessoas que auxiliam no enterro assim como petiscos para as pessoas que apresentam as suas condolências.”; “As visitas, que continuam a afluir ao longo das 48h seguintes, aproximam-se da base do caixão e aspergem o corpo com água-benta, uma prática cuja função manifesta é afastar os espíritos maléficos…Após este rito, cada visitante dá os pêsames a cada um dos membros da casa, fazendo, em seguida um donativo para uma missa e inscrevendo o seu nome na lista dos visitantes.”; “o morto é referido como o falecido”; “A presença no velório dos filhos …mesmo no caso de estarem emigrados”. As interpretações que o autor retira destas prática, são: “A ênfase colocada ao longo de todo o velório e do enterro pode ser interpretada como uma forma de negar a morte e destacar a vida dos que ficam. O auxílio dos que «correm com o enterro» …é oferecido num espírito de «reciprocidade generalizada».”

Poderão pensar, mas claro que “Norte e Sul” são assimétricos enquanto existem e se reproduzem, e estas diferenças repetem-se em países, em cidades, em vilas, em prédios e até em famílias, mas será que esta lógica desperta os nossos sentidos para aceitar a morte e as diferentes formas de serem vividas por muçulmanos, por judeus, por cristãos, por hindus, por budistas, por ateus, por agnósticos…. Um país tão pequeno num planeta tão imenso. Uma cabeça a pensar entre tantas e um coração que bate enquanto outros páram.